O belo se esconde no evidente. Imiscui-se por toda a parte. Ora claro, ora escuro, tinge a textura do cotidiano. Muitas vezes camuflado no óbvio, pega o coração de surpresa. Olhos displicentes correm o risco de não captar toda a formosura que permeia a vida.
Um coração desolado não vê o inefável porque basta um instante, um hiato, um risco no céu, para sumir o que pode encher a vida de viço. Sempre alguma lindeza esquecida espera ser descoberta no fundo do pântano, na escarpa da rocha, no rosto crispado da viúva, no riso frouxo do adolescente.
Em cada alvorada renasce um anseio renovado pelo belo. O orvalho aguça o desejo de alimentar a alma com os diferentes matizes da mata. Quando o dia se alonga, temos fome; uma fome pelo eterno. E a noite traz a bruma leve do Espírito que faz do descanso o tempo dos sonhos.
De repente, sempre de repente, no dia-a-dia, está um anelo pela nuança da poesia; nuança que transfigura as letras em recado divino. O corpo pede melodia para deixar o coração estranhamente sereno; e da calma, vem a excitação que converte o lamento em vontade de pular de alegria. Existe, sim, uma beleza que torna a vida irresistível.
O belo está sempre por perto e tem poder. Fascinante, inspira o poeta. Trasforma o leigo em criador fecundo, incorpora contentamento no triste, sensibiliza o bruto,muda o apático em trovador, leva o tosco a bailar em ritmos imponderáveis e sensibiliza o cético para que perceba a eternidade na realidade crua.
O belo é divino.
Por: Ricardo Gondim
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